Um pouco
mais da vida e obra de Sidney Tenucci
Sidão ficou
famoso no Brasil com o trabalho que fez com a marca OP. A primeira grande marca
de surfwear de nosso mercado, inovando com produtos, abrindo horizontes de
possibilidade de crescimento e estratégias de marketing. Nos 61 anos em que
viveu nos deixou um legado incrível e ajudou a desenhar o estilo de vida do
surfista brasileiro.
CONVITE DE LANÇAMENTO DE SEU SEGUNDO
LIVRO EM 2008
FOTO DE PAULO VAINER NO CANTO DO
MOREIRA, MARESIAS
Antes de
tudo Sidão foi um puro surfista de alma. O seu envolvimento com o surf começou
na praia de Pitangueiras, no Guarujá. Suas primeiras paixões a música e o surf.
O papel de empresário lhe rendeu notoriedade. Nos anos 2000 voltou seu foco
para a habilidade quase que inata de escritor, talvez a sua maior vocação.
Aqui presto
uma homenagem com algumas imagens que tenho em meu computador. Tentarei seguir
uma ordem cronológica e encaixarei informações desde os tempos da adolescência,
quando nos conhecemos. Impossível não ser um pouco “pessoal” nesta postagem.
SIDÃO SURFANDO NO CANTO DO MALUF
PRAIA DE PITANGUEIRAS, ANOS 70
DIVERSAS REPRODUÇÕES DE SEUS ÁLBUNS
FORAM FEITAS POR ALBERTO SODRÉ NA OCASIÃO DAS GRAVAÇÕES DA SÉRIE 70 E TAL
FOTO: ARQUIVO PESSOAL
A PRIMEIRA FOTO DELE AO LADO DE UMA
PRANCHA DE SURF
UM MODELO GLASPAC E UMA BERMUDA DE
HELANCA
AINDA PRECISO DESCOBRIR O NOME DESTE
AMIGO
Conheci
Sidão surfando ao lado da Ilha de Pitangueiras no Guarujá, nossos apartamentos
eram quatro quadras distantes, mas estávamos sempre ali, com a turma, de dia na
praia, à noite no centrinho e no cinema.
Uma
curiosidade interessante é que eu tenho apenas duas fotos com a prancha do “dragão”,
minha segunda prancha, uma São Conrado 7’0”, a que me contemplou com o apelido
dado pela turma do surf, que carrego até hoje. Nestas duas fotos, Sidão aparece
ao meu lado.
PASSAGEM DO EDIFÍCIO SOBRE-AS-ONDAS
ESTE CROMO É DO ACERVO DE UM GRANDE
AMIGO NOSSO, O GUITARRISTA E SURFISTA CLÁUDIO CELSO, OU CLAUDINHO PIERONI, COMO
O CHAMÁVAMOS
EU ESTOU COM A MINHA SÃO CONRADO
VERDE, SIDÃO COM UMA PRANCHA SURF CHAMPION E TAMBÉM GOSTARIA DE
DESCOBRIR O NOME DESSE NOSSO AMIGO, LEMBRO DELE, MAS NÃO LEMBRO O NOME, COM UM
MODELO DE CANHÃO GLASPAC, PROVAVELMENTE DA SÉRIE MK1
ESTA FOTO É UM TESOURO PARA MIM,
SURFANDO COM A PRANCHA DO DRAGÃO NA PRAIA DAS ASTÚRIAS 1971
AO FUNDO, APARECE SIDÃO REMANDO COM A
SUA SURF CHAMPION
ESSA FOTO É DE UM AMIGO SURFISTA
CHAMADO ARMANDO, NÃO LEMBRO DO SEGUNDO NOME DELE
No verão de
1972 Sidão inoculou o vírus das surf trips, ao viajar para o Peru com um grupo
de amigos do Guarujá, encontraram e fizeram amizade com cariocas. Viajaram de
Punta Hermosa até Chicama, subiram as montanhas até Machu Picchu. O espírito
viajante em busca de ondas, que começou com Saquarema, o Litoral Norte de São Paulo
e o Sul, para o surfista brasileiro estava se enraizando e a fase internacional
começou com o Peru e logo se alastraria para o Hawaii e o resto do mundo, ainda
nos Anos 70. Entre os paulistas, Sidão estava na linha de frente.
SIDÃO E AMIGOS EM CHICAMA
A PARTIR DA ESQUERDA, JOÃO PRÍNCIPE,
LUÍS MELLO, TEIXEIRA, ZÉ MARIA, MAGOO ATRÁS DE SERGIÃO SACHS, GESTICULANDO E
SIDÃO. FOTO ARQUIVO PESSOAL DO SIDÃO, PROVAVELMENTE TIRADA POR CARLOS MOTTA
CARREGANDO O ÔNIBUS RUMO A CHICAMA,
1972 – FOTO: SIDÃO
A partir de
1972, com 17 anos, Sidney Luiz Tenucci Júnior ganhou uma filmadora SUPER 8 de
seu pai e começou a registrar momentos de suas viagens e do Guarujá.
AUTO-RETRATO FILMADO EM ESPELHO
SIDÃO
NA TEMPORADA HAVAIANA 76\77
RECORTE DE CENA DE UMA MONTAGEM DE
UMA HORA, DAS GRAVAÇÕES DE SIDÃO COM A SUA SUPER 8, COMPILADAS POR ALBERTO
SODRÉ (COMMUNIQUÉ)
DISPONÍVEL NO SITE WAVES NO LINK:
Durante esta
fase, da câmera SUPER 8, Sidão chegou a gravar mais de cinco horas de imagens, em filminhos de 3 minutos, principalmente de suas viagens. A qualidade não é das 10 mais, mas os registros
são inestimáveis em termos de resgate do lifestyle durante os embrionários Anos
70.
Além destes
filmes, Sidão pegou o costume de, ao final de cada ano, montar um daqueles
álbuns de fotos, plastificado e com fotos em papel e depois, a partir dos anos
80, também recortes de revistas e catálogos da OP.
A segunda
grande aventura de Sidão e seus Brothers do Guarujá foi em 1974, partindo do
Brasil pelo Peru, passando pela América Central e culminando na Califórnia. Na
primeira postagem em homenagem à Sidão é possível ler detalhes sobre esta
viagem. Aqui abaixo mais algumas imagens de seu álbum de 1974.
SIDÃO TINHA UM CARINHO ESPECIAL POR
ESTES ÁLBUNS
MUITAS VEZES FAZIA LEGENDAS DAS FOTOS
AMPLIE QUE É POSSÍVEL LER ALGUMAS
ANOTAÇÕES DO “SIDÃO ESCRITOR”
AO FINAL DE 1975 SIDNEY SE LANÇOU EM
SUA PRIMEIRA TEMPORADA HAVAIANA
NESTA PÁGINA DO ÁLBUM ELE FAZ A
LAMINAÇÃO, EM PLENO NORTH SHORE, DE UM SHAPE DE SAM HAWK. LEMBRO QUE ELE CHEGOU
A TRABALHAR NO BRASIL, AO LADO DO AMIGO ZÉ ROBERTO RANGEL, COM A FÁBRICA DE
PRANCHAS GREEN ROOM
A GALERA QUE ESTAVA COM ELE NA TEMPORADA 1975\76
Na temporada
havaiana de 1976\77 foi quando estreitei minha amizade com Sidão, ao repartirmos
um quarto no North Shore e depois viajamos juntos para Maui no início de 1977.
SIDÃO SURFANDO EM HONOLUA BAY
IMAGEM FEITA POR MIM E RECORTADA DE
SEUS FILMES SUPER 8
PÁGINA DE UMA REVISTA VENICE DOS ANOS
2000
SIDÃO NOS CAMPOS DE ABACAXI ACIMA DE
HONOLUA BAY EM NOSSO CARRO ALUGADO CHECANDO AS PERFEITAS DIREITAS, FEVEREIRO 1977
FOTO: DRAGÃO
FOTO: DRAGÃO
ABAIXO EDDIE EM FOTO DE KLAUS MITTELDORF
No final da
década de 70 Sidão decidiu abrir uma marca de surfwear, o objetivo era
continuar bancando seu desejo incontido de viajar atrás das ondas. Quando ele
começou a OP não tinha ideia da magnitude que seu negócio iria tomar. Outros
amigos já haviam sido precursores, como o carioca Tico Cavalcanti, e os amigos do
Guarujá, Dany Boi, Fernando Rego, Madinho e Zé Roberto Rangel, com a marca
Lightning Bolt. Wady “Mansurf” e Ermínio Nadim, com a marca Tangerina, que
depois viria a se transformar na Sundek, também foram pioneiros (entre
outros) surfistas\empresários de confecção.
Nos Anos 80
as marcas de surf tiveram um crescimento estrondoso e sem precedentes no
cenário da moda. A OP acabou se transformando na líder do mercado. As vendas
cresciam exponencialmente.
SIDÃO, NO CANTO SUPERIOR DIREITO DE
CAMISETA VERDE, COM SUA EQUIPE NOS COLORIDOS ANOS 80. NESTA FOTO SIDÃO ESTÁ AO
LADO DE SUA IRMÃ LOLLÔ TENUCCI, PEÇA FUNDAMENTAL PARA O SUCESSO DA OP. TAMBÉM
APARECE SEU PAI, CONHECIDO COMO "SEU SIDNEY", ABAIXO DELES DE VERMELHO, NO CENTRO (DE CAMISETA ROSA CLARO) O
DESIGNER MARCELO FUKUDA E DEITADO NO CHÃO DANY BOI, QUE TRABALHANDO COM SIDÃO
FOI UM DOS MAIORES RESPONSÁVEIS PELO SUCESSO DOS EVENTOS OP PRO
No meio dos
anos 80, já com o nascimento das revistas Fluir e Inside (a partir de 1983), a
OP tomou a linha de frente. Os anúncios da marca estavam nas melhores posições
em todas as revistas. A partir de 1985 o OP Pro se transformou no padrão de
campeonato, uma evolução dos festivais criados por Paulo Issa nos anos 1970. E
Sidão sabia da importância de ter uma boa equipe de surf, os atletas que ele
contratava eram verdadeiros amigos e grandes surfistas.
IRMÃOS BROTHERS, OS BUENO E OS VON
SYDOW, VIZINHOS DO GUARUJÁ
FINALISTAS DO CAMPEONATO PRIMO NA
PRAIA DO PERNAMBUCO, 1981
DA ESQUERDA, TAIU BUENO, COM SUA
LOCAL MOTION BIQUILHA, HAROLD (DODO) VON SYDOW, TOTÓ BUENO E CHRISTIAN VON
SYDOW
TAIU E DODO FIZERAM A FINAL HOMEM A
HOMEM, TODOS ERAM PATROCINADOS PELA OP
FOTO: FACEBOOK TAIU
Além desta
quadra de talentosos surfistas do Guarujá, Sidão trouxe para o time diversos
atletas de ponta e formadores de opinião, como Ricardo Bocão, Roberto Formiga,
Tinguinha Lima e o catarinense David Husadel, entre muitos outros.
ANÚNCIO DE DIVULGAÇÃO DA ETAPA DE
ABERTURA DO SEGUNDO ANO DO CIRCUITO ABRASP COM DAVIZINHO HUSADEL EM DESTAQUE
Em 1987 o terceiro
OP PRO foi a etapa de abertura da recém-criada “Associação Brasileira de Surf
Profissional”, foi vencido por Paulo Matos na praia da Joaquina, palco das três
primeiras edições do evento. Em 1988 foi realizado no Quebra-Mar da Barra da
Tijuca o primeiro grande campeonato do Circuito Brasileiro na cidade do Rio.
Sidão também seria pioneiro ao fazer um OP PRO em Imbituba (1994) e depois em
Fernando de Noronha (1995). Ele gostava de inventar e investir em novidades.
REPRODUÇÃO DE PÁGINA DE UM CATÁLOGO
DA OP, PEÇAS DE MARKETING EM QUE ELE SEMPRE APRESENTAVA MUITA CRIATIVIDADE, COM
DESTAQUE PARA O SURFISTA TADEU PEREIRA, QUE VENCEU O OP PRO DE IMBITUBA EM ONDAS
FANTÁSTICAS, COM PRAIA LOTADA.
A FOTO DE SIDÃO SURFANDO É EM KUTA
REEF, BALI
O ORIENTE SEMPRE O ATRAIU
O ORIENTE SEMPRE O ATRAIU
A FAMOSA SEDE DA OP NA AV. DOS
BANDEIRANTES NA CAPITAL PAULISTA, DURANTE A FASE ÁUREA DA EMPRESA NO INÍCIO DOS
ANOS 90
No final dos
anos 90 e início dos anos 2000 a situação do mercado estava sofrendo uma
transição. Além disso, aos quarenta e poucos anos Sidão tomou um grande susto
ao saber que tinha câncer na próstata. Na época apenas seus amigos mais
chegados ficaram sabendo. Ele tratou a doença, reestruturou a marca e voltou em
forma de licenciamento.
REPRODUÇÃO DE PÁGINA DA REVISTA
PEQUENAS EMPRESAS E GRANDES NEGÓCIOS
Foi também
já nos anos 2000 que Sidão trouxe à tona (de forma mais forte), a sua paixão
por escrever. Com a marca sendo produzida pelos licenciados, Sidão atuava como
um consultor de marketing e voltou a ter tempo para viajar e se inspirar para
escrever com maior afinco.
Na gravação
que fiz com ele em junho de 2014 ele conta em detalhes todos os aspectos que o
levaram a nunca assinar um acordo com a matriz da OP nos EUA. Todos seus amigos
que agiram da mesma forma que ele no final dos anos 70 e início dos anos 80,
registrando marcas que encontravam nas revistas Surfer e Surfing aqui no
Brasil, chegaram a bons termos com as matrizes. Zé Roberto Rangel com a Town
& Country, Piazza com a Billabong, os irmãos Fernando e Zezinho Rego com a
Quiksilver, mesmo o caso da Rusty com Pedro Bataglin no Rio e Alberto Hiar em
São Paulo, que chegaram a brigar pela marca aqui, mas hoje está tudo OK, Pedro até
trabalha na Rusty na Califórnia e a marca é licenciada para a Surf Co., do
grande amigo de Sidão, Alfio Lagnado. Para saber mais detalhes do “porque” de
Sidão nunca ter fechado acordo, leiam o perfil dele publicado na edição de maio
de 2015 da revista Hardcore (tem o link na postagem que fiz no início deste
mês).
O fato é que
o foco de Sidão passou a mirar a literatura a partir dos anos 2000, seu
primeiro livro lançado foi Almaquatica, mas antes disso ele já publicava, em
sua coluna SOUL SURF, dentro do site Waves, as andanças do Surfista Peregrino
pelo oriente.
REPRODUÇÃO DE POST DO SURFISTA
PEREGRINO NO SITE WAVES
Nestas postagens de Sidão ele sempre alterava o crédito de seu “currículo” ao final de cada texto, alguns eram bastante interessantes. Tenho certeza que era o próprio Sidão que escrevia isso também, talvez com algum toquinho espirituoso do Juninho, editor do Waves à época.
VEJAM:
Sidão Tenucci
é formado em jornalismo pela Escola de Comunicação e Artes da USP (Universidade
de São Paulo) e com pós-graduação em letras. É surfista há 42 anos. Viajou 50
países na caça por ondas e pelas diversas visões de mundo. É diretor de
marketing da OP (Ocean Pacific). Autor dos livros Almaquatica (Fnac), em
parceria com o fotógrafo Klaus Mitteldorf e o designer gráfico David Carson, e
da narrativa de aventuras de viagens O Surfista Peregrino (Livraria
Cultura). Não desiste e tenta, há décadas, inutilmente, prender o tempo com
palavras.
O livro
Almaquatica foi uma parceria entre Sidão, autor dos textos, ilustrado com fotos
de Klaus Mitteldorf e a arte (projeto gráfico), do aclamado norte americano
David Carson. O resultado é uma pura peça de arte, em todos os três sentidos.
Uma fusão de talentos. O livro foi publicado bilíngue.
KLAUS MITTELDORF E SIDÃO NA LIVRARIA
FNAC
ABAIXO, REPRODUÇÃO DE MATÉRIA SOBRE O
LANÇAMENTO DO LIVRO QUE FIZ PARA A REVISTA VENICE EM 2006 (CLICANDO E AMPLIANDO
AS IMAGENS É POSSÍVEL LER)
CAPA DA VENICE MAG EM QUE SAIU A
MATÉRIA
DANILO COSTA EM FOTO DE ALEKO
STERGIOU NO TAHITI
Quando
preparei a matéria, perfil de Sidão, para a revista Hardcore eu havia separado
um pequeno trecho, de um dos capítulos, para terem uma ideia do estilo de
escrita do Sidão. Apesar da matéria sair com 16 páginas, acabou sendo cortado
por falta de espaço, mas aqui vai o trecho completo:
O Surfista Peregrino
Cosmmos do Brasil Produção Editorial – 2007
“Cada
folha é diferente, muito diferente. Cada uma possui, além da sua própria
aparência, a sua própria personalidade. Uma tem nervuras mais salientes ou
escondidas na pele da folha; outras, perfis alongados, arredondados ou
quebrados no dorso, na cabeça ou nas costelas. Existem aquelas com um toque
mais áspero, mais liso ou até fibroso. Isso tudo eu já sabia. O que me surpreendeu
foi observar que cada uma delas cai diferente. Cada folha faz o seu próprio voo,
ou melhor, plana, desenhando sutis e maravilhosos traçados no ar; desenhando na
tela de Deus a pintura do seu movimento único no seu caminho para a terra. Uma
verde e grossa, por exemplo, caía em balanço, oscilando firme e constantemente,
com autoridade; outra menor, mais acinzentada e seca, caía alvoroçada,
estremecendo em estertores frenéticos durante a queda; outra ainda, pequena,
caía reto e inapelavelmente, como um corpo morto ansioso por encontrar o solo,
contrariando sua aparência suave; outras duas não se descolaram e caíram
fortemente abraçadas, como um casal apaixonado (que pressentindo a morte que se
aproxima, estreita ainda mais o abraço). Uma
mais redonda e rajada como um tigre, criativa na sua arte, tecia uma trajetória
em volteios, sem pressa em cair, brincando e dançando em lindos e imprevisíveis
movimentos felinos, num pêndulo errático e cômico, me fazendo sorrir.”
O surfista peregrino viaja pela Índia, Sri Lanka e
Maldivas em busca de si próprio, encontra ondas e pessoas, rios e folhas.
Faz-nos parar para pensar, refletir sobre valores da vida. O que é relevante
observar, sentir.
Sua última
obra lançada foi o livro POENTES DE AMOR, também destaquei um trecho.
Décor Books – 2012
“Peru,
1972. Não, eu não tinha bigode, eu usava amor e uma prancha.
As
ondas me despiam, quase sempre lavando tudo de estranho e errado e amargo.
O
horizonte servia para passar os olhos e esperar a próxima série e seus
mistérios sempre diferentes.
Com
18 anos eu não era nada, mas me sentia tudo.
Deixei
os cabelos queimados de sol nos ombros, e o pensamento no invólucro de uma
paixão perene.
Pedi
carona nas carreteras peruanas rumo às águas frias do Pacífico...
...
...queria
abraçar o mundo com minha vontade, cruzar todos os mares, olhar cada rosto e
ouvir cada voz.
Eu
queria amar todas as mulheres e experimentar tudo enquanto surfava todas as
ondas do universo ao mesmo tempo.
O
meu apetite era do tamanho da minha estupidez. Graças a Deus.”
Um livro de poemas, são 70 deles, assinados por Sidão
e ilustrados por 55 artistas diferentes.
Uma outra
coisa que acho interessante diferenciar aqui é a foto que foi utilizada na
Hardcore para destacar os 3 livros dele (ver páginas na postagem anterior de 7
de outubro), uma foto da Birmânia – Myanmar, de seus arquivos digitais das
viagens mais recentes. A foto é de 2013, foi publicada em preto e branco, aqui
coloco a foto em suas cores originais.
FOTO ARQUIVO PESSOAL SIDÃO
Para
finalizar esta postagem de homenagem ao meu amigo, que muito deixou de legado
para os surfistas e empresários brasileiros, duas coisas.
- Um trecho de seu quarto livro, que ele ainda estava dando os toques finais, mas me passou em primeira mão para que eu lesse e desse uma opinião. Aqui vai o início do primeiro capítulo.
- Uma colagem com mais algumas fotos e legendas. Deixo o compromisso de ainda incrementar esta postagem no futuro. Uma das mais interessantes possibilidades de um BLOG é esta facilidade.
Primeiro
o trecho do livro ambientado na Escandinávia. Respirem fundo, não é uma leitura
de fácil digestão, mas demonstra o grau de “estado da arte” que nosso amigo
havia atingido com seu dom literário.
NO
FINAL MAIS FOTOS DE BÔNUS
Estocolmo
Sidney Tenucci
No apartamento de Ingrid
Imperceptivelmente, quase sem precisar
se mexer, com um movimento híbrido de felino e marsupial escandinavo, entrou.
Numa leve torção involuntária, algumas vértebras do seu pescoço estalaram. Alguém
ao lado ouviu e o encarou de modo estranho. Mais uma vez seu ímpeto foi maior
que o seu raciocínio, um hábito que ele reconhecia como recorrente e perigoso.
Malucos espalhavam-se deitados pelos tapetes de urso polar. Um deles tinha um
baseado entre os dentes, outro um enorme cachimbo de âmbar. Uma loira baixinha
e sardenta tinha amarrado vários cigarros nos longos cachos decorados por
dreads jamaicanos, parecendo uma árvore de Natal dos trópicos. O Primeiro Eu
não gostou do que via. Algo lhe incomodava, ou talvez quase tudo. Ele sempre
foi inconsequente e corajoso como um touro entorpecido. Nesses momentos seus olhos
costumavam injetar sobre um alvo que não via, com raiva do que não entendia. Esse
instinto tentou se manifestar novamente, mas, dessa vez, ele não permitiu que
aflorasse. Animais rendem metáforas imbecis, a sua vida rendia explosões pouco
inteligentes. Tinha medo do desconhecido, e os desconhecidos tinham medo de
dele. Instintivamente ele sabia o que não era bom, que não era uma boa pessoa.
Sempre soube. Exatamente como aquele apartamento, ele também não era confiável.
Nas veias dos olhos do inca Nenhuro, seu velho e inconsequente colega, em ritmo
de rapsódia ensandecida, as pequenas tiras vermelhas saltavam volumosas e
choravam lágrimas temperadas a cannabis severas. Loucas rosas de maconha suando
a orvalho ácido. A princípio pulsavam e pareciam eternas no seu encantamento,
mas, no momento seguinte, como sempre e finalmente sem cor, seriam trocadas por
outras, mais jovens, menos mofadas. “Impossível não traçar uma analogia com a
trajetória de algumas mulheres e sua pele macia e descartável pela crosta
áspera do planeta”, pensou: “Se não fosse pela pele das mulheres esse mundo
seria uma merda”. Súbito, teve uma antiga
e péssima sensação, um enjoo inexplicável. Na tentativa de alcançar um tom de
perspicácia e equilíbrio, a decoração da casa de Ingrid ficara pejorativamente
moderna e previsível. O ambiente fracassara. Quadros e tapetes sem vivacidade e
de caráter duvidoso comprometiam o seu já frágil respeito pela proprietária. O
fato de ela ser sua amante ocasional só tornava o julgamento mais contundente. Poucas
cadeiras raquíticas com pretensões “light” e cortinas balinesas do mercado para
turistas com baixo poder aquisitivo afloravam e ofendiam a vista. Flores de
plástico confeccionadas na Finlândia insultavam os sentidos, embora a perfeição
de suas formas ludibriasse o olfato por alguns segundos. Não se viam floreiras
naturais, Ingrid não tinha paciência para regá-las. Um totem asteca da região
mexicana de Oaxaca sentia-se visivelmente deslocado e constrangia-se ao lado de
uma geladeira pintada com um preto pálido. Mesmo para paladares kitsch, a
mobília ficara claramente indefesa, e dava um certo mal-estar circular por ali.
“Não deem ametistas aos porcos!!”, gritou uma avozinha esotérica de dentro do seu
arquivo emocional. Sentou-se a uma mesa redonda e séria que pareceu um pouco
mais convidativa, embora com remotas possibilidades de refeições servidas, ele
tinha certeza, pelo menos em curtíssimo prazo. Ingrid não se preocupava em
alimentar seus convidados. Para ela era “primeiro sexo e comida em décimo”.
Suas reservas de gordura nos lugares certos administravam o gasto calórico do
inverno perfeitamente. Ingrid levantou-se do seu sofá preferido e dirigiu-se ao
grupo de pessoas jogadas e drogadas em cima dos almofadões xadrez e dos “puffs”
de couro marrom ao lado da lareira de pedras. O Primeiro Eu sentiu-se nauseado
com o impacto da visão daquela bunda, como se tivesse sido a primeira vez que
tivesse testemunhado seu poder. Mais que voluptuosa, era extravagante.
Desafiava com galhardia e ao mesmo tempo as leis da estética e da gravidade.
Surgia imensa e descia, com vigor e ritmo, de uma cintura ridiculamente fina.
De passagem, transmitia estranho aconchego. Depois de uma empinada tão obscena
na altura quanto desconcertante expansão na largura, continuava com veemência e
garbo em dobras contínuas e decrescentes, em cascata, para decair abruptamente
e sem aviso prévio, terminando despudorada e maravilhosamente desproporcional
nas coxas fortes como postes. “Ancas de potra e aliás combinadas”, diziam os
admiradores. Aquela bunda introduzia no mundo moderno um novo conceito de
beleza, trazida sem escalas ou melindres do Período Pleoscênico. Uma visão
brutal e atávica materializada no bairro de Zoegemfald. O Primeiro Eu se
apaixonou imediatamente, mais uma vez. Esqueceu imediatamente todas as falhas
de caráter e as má-criações da sueca. Suas crises de mau humor, seu destempero
com os criados, sua voz desagradavelmente alta ríspida quando queria alguma
coisa, seu bafo de arenque defumado enquanto dormia. Esqueceu, inclusive, um
dos ditados imortais que seu pai havia lhe dito, quando ainda era adolescente:
“Se apaixonar por um cu só pode dar merda”. Nesse momento viu alguém passando
com uma bandeja e tentou inutilmente alcançar uma bebida de uma tonalidade
vermelho escura. Queria que fosse algo de preferência forte, e que tivesse o
dom de corroer aquele algo indefinível dentro de si, cauterizar aquela dor.
Tentava imaginar que espécie de vagina soberba se esconderia por detrás
daquelas carnes. Pela extensão da área, muito provavelmente necessitaria de um
mapa para encontrá-la. Todos em volta pareciam calmos e sem surpresa nas faces
descoradas pelo contínuo frio de intermináveis meses lá em Estocolmo.
ESTAS SÃO AS
PÁGINAS 1, 2, 3 E 4 DE 274 QUE TENHO EM MINHA MÁQUINA
VAMOS ÀS FOTOS FINAIS
DATCHA TENUCCI, FRANK DA GUARDA E
SIDÃO
SIDÃO E AS FILHAS JULIANA E ISABELLA
TENUCCI
EM MARESIAS COM OS AMIGOS DO CANTO DO
MOREIRA, ANOS 80
DA ESQUERDA: JOÃO HELOU, SIDÃO, OS
IRMÃOS MADINHO E THYOLA CHIARELLA, DODO VON SYDOW E ALFREDO BAHIA
SIDÃO EM SUA FASE DE SOLTEIRO NO RIO
DE JANEIRO
FINAL DOS ANOS 70 - FOTO: ARQUIVO PESSOAL
ANOS 2000, PONTA DE PÁGINA DE UM DE
SEUS ÁLBUNS
SURFANDO A VALINHA EM FRENTE DE CASA
ARTE DE SÉRGIO BUENO, SOBRE FOTO DE ROBERTO
PRICE
SALSA BRAVA, COSTA RICA, ANOS 90
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